Conquistada por um olhar

Anna Basile - Sicília - Itália / Foto: Lourdes Crespan
Do balcão, com suas flores, reconheço um rosto jamais visto e que me observava... era Anna, com seu vestido florido e seus olhos límpidos. Ao entrar na casa, me dou conta que os degraus que me conduziam a sala de estar eram íngremes e estreitos... e que do alto da escada, a mesma senhora, com seus brincos, me acolhia com o seu olhar cheio de alegria.

No interior da casa, objetos me levavam a um tempo distante, marcado pela história, repleto de sentimentos de pessoas que ali habitaram e que já não mais existiam... A primeira imagem que meus olhos tocam é um pequeno altar sagrado, um espaço acolhedor e que ao mesmo tempo acolhe e que nos faz sentir bem.

A mesa estava pronta, com seus pratos e talheres de festa, ao redor, um quadro de Jesus Cristo, uma máquina de costura, uma cadeira vazia, usada, colocada próxima de uma janela, com sua cortina de renda branca, aberta, onde se podia ver uma das ruas de Monreale, na Sicília.

Anna passa da cozinha à sala de estar, tudo quase pronto para o almoço. A televisão ligada me revelava a riqueza de uma cultura popular, tão diferente da minha. Conversas paralelas... me sinto em casa. A senhora, com o olhar cuidadoso e acolhedor, depois de nos servir, também se senta e come conosco.

Na simplicidade do diálogo, começo a contemplar melhor aquela senhora e o seu olhar, que me transmitia vida. Ao ser interrogada sobre sua história, Anna, com os seus cabelos brancos e quase 80 anos de vida, iniciava sua viagem no tempo: olhares se confundem com palavras, sentimentos e silêncio.

Descubro que ela era a filha mais velha da família Basile e, que, quando jovem, tinha decidido entrar em um convento. Mas, depois de alguns dias de vida em clausura, Anna recebe a visita inesperada de sua mãe: seus oito irmãos precisavam de ajuda.

De fato, a irmã mais nova, ainda pequena, já não mais comia e somente repetia: "mama, mama". Ao vê-la assim tão frágil, nos braços da mãe, a filha mais velha da família retorna a casa. Mas, em seu coração ainda ardia o mesmo desejo: viver somente para Deus.

Os dias passam e Anna continua a rezar... Desta forma, em uma manhã, bem cedo, um pouco antes da santa missa, sozinha, seus olhos atentos encontram o olhar penetrante de um jovem sacerdote, Padre Faccenda. "Aquele olhar me conquistou", afirma com convicção.. Era 1964.

Anna descobre que sua vocação não era somente contemplativa, mas também ativa, e aos poucos se torna Missionária da Imaculada-Padre Kolbe, se consagra a Deus por meio dos votos de castidade, pobreza e obediência, sem deixar o seio de sua família.

Com o sorriso nos lábios, me revela sua a experiência mais profunda e que transformou sua vida: "entre as missionárias não há diferença, são todas iguais". Com este tesouro, contemplo pela última vez, da sacada de sua casa, a Missionária Anna Basile, com seus 79 anos de idade, que continua a me observar, enquanto caminho pelas ruas da vida.

Missionária Lourdes Crespan
Jornalista

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