Uma nova maternidade

A atitude de escuta de Maria e a sua vida de oração fazem com que o Espírito possa agir nela e torná-la mãe. A maternidade é para Maria tanto a vocação específica que Deus lhe concede, quanto o fruto da plenitude do Espírito dentro dela. Por isso, Santo Agostinho pode dizer que Maria concebeu o Filho antes na fé e depois em seu seio. Portanto, Maria é mãe mais porque acreditou do que porque gerou. É mãe porque respondeu “sim” ao Senhor.

Isso me faz compreender que a verdadeira maternidade, no Reino dos Céus, é a maternidade nos valores do espírito, expressa na caminhada da fé. O “sejam fecundos e multipliquem-se, encham a terra” (Gn 1,28) não é somente um mandamento-biolóligo, mas indica o crescimento de uma filiação através da maternidade espiritual que deriva do nosso amor, da nossa fé, da nossa alma.
Se ficarmos na escuta, se dissermos “sim” à vontade de Deus a nosso respeito, também nós nos tornaremos “mãe” como Maria, como a Igreja. Não ficaremos fechados em nosso pequeno “ovo”, entre quatro paredes, com um filho ou dois, ou na nossa comunidade, mas o nosso coração será “mãe dos viventes” e abraçará a todos, dando a vida também para aqueles que provavelmente nunca conheceremos. Um dia, porém, os conheceremos, quando, tendo, ficado na escuta, em oração e tendo respondido com o nosso “sim”, obteremos a vida eterna e, tendo chegado lá, ouviremos alguém nos cumprimentar: “Eu fui salvo porque você ocupou o seu lugar na história da salvação e foi mãe para mim...”.

Maria expressa essa realidade materna através também de uma atitude de oferta. Quando apresentou Jesus no templo, ofereceu a si mesma juntamente com o Filho, e Simeão lhe disse: “Uma espada há de atravessar-lhe a alma” (Lc 2,35). O que tudo isso nos diz?

Cada um de nós tem a sua própria história. E basta se aproximar de alguém para perceber todo o seu mundo de sofrimento e de dor. Quantas vezes somos tentados a nos perguntar: mas por quê? Isso nos perguntamos diante do mal, diante das dores morais e das humilhações, diante dos sofrimentos físicos, das tentações, das trevas do espírito, do “distanciamento” de Deus.

A nossa inteligência não é capaz de fornecer respostas. Não podemos resolver o problema da dor com raciocínios, com a lógica humana. Devemos perguntar isso a Deus, refugiando-nos em sua vontade. E a resposta não tardará a chegar. Ele se fez “obediente até a morte e morte de cruz” (Fl 2,8), a fim de que pudéssemos ter a vida e a tivéssemos com abundância (cf. Jo 10,10).

Contudo, se abrirmos o Evangelho, veremos também uma mulher, livre para fazer ou não fazer a vontade de Deus, livre para aceitar ou não aceitar. Veremos essa mulher abraçar a dor e, então, também nós acharemos a resposta.

Maria, ao apresentar Jesus no Templo (cf. Lc 2,22-35), ouve Simeão lhe dizer aquelas palavras. Palavras misteriosas, inspiradas. Maria não se revolta. Medita em seu coração. Há nela a oferta do Filho que não se limita a um gesto ritual, mas é um verdadeiro gesto de oblação, através do qual oferece a si mesma juntamente com o Filho ao Pai eterno, em prol da salvação do mundo. Pois havia compreendido que para salvar o mundo era necessário sofrer, era necessário derramar o sangue, e o sangue do seu Filho era o único capaz de unir o homem a Deus.

Maria oferece o Filho


Depois vemos Maria fugindo para o Egito (cf. Mt 2,13-15). Ela também deve ter se perguntado o “porquê”, mas guardava tudo no seu coração. Vamos vê-la procurando o Filho que havia perdido, numa aparente distração que a torna mais próxima da nossa caminhada (cf. Lc 2,41-50). “Por que você fez isso conosco?”.  O que me agrada em Maria é essa ausência de inúteis conversas, de inúteis queixas.
E me agrada ver Maria que acompanha o Filho que fala às multidões e não pára nem mesmo para receber a sua mãe (cf. Mc. 3,31-35). E Ela não se espanta, não pretende nada, faz a vontade de Deus e ouve aquelas palavras do Filho que convida a olhar para a perfeição do Pai.

Agrada-me ver Maria que não fica se lamentando ao seguir o Filho na paixão, mas está aí, aos pés da cruz (cf. Jo 19,25), onde parece estar dizendo: “Completa a tua obra. Estou junto de ti, do mesmo modo como eu estive sempre contigo”. Maria sempre esteve com Jesus não tanto porque lhe deu a vida (não é difícil ser mãe de sangue), quanto porque cooperou com Ele, sofreu com Ele e caminhou dia após dia a fim de crescer na virtude: Depois pega o seu corpo e o deposita no sepulcro, porque sabe que somente através da morte Ele poderá sair vitorioso e triunfante, refazendo o fio do amor quebrado.

E Ela, após essa morte, saberá se tornar a mãe dos viventes, mãe da Igreja, porque compreendeu que toda maternidade é um ato de redenção e toda redenção se dá através do derramamento de sangue.
Então, entendemos bem por que Maria, ao querer nos tornar apóstolos, nos convida ao sacrifício, à penitência (pensemos em Lourdes, Fátima, no Padre Kolbe). Por isso, não nos resta outra coisa senão pedir a Maria que nos obtenha  a força para realizar a vontade de Deus, custe o que custar; a força para dizer: “Se é possível, afaste de mim este cálice. Contudo, não seja feito como eu quero, e sim como tu queres” (Mt 26,39). Assim, cada um de nós, completará em si aquilo que falta aos sofrimentos de Cristo, como afirma São Paulo (cf. Cl 1,24).

Frei Luigi Faccenda

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